sábado, 9 de julho de 2011

Oriente - Gilberto Gil

De: Gilberto Gil

Se oriente, rapaz
Pela constelação do Cruzeiro do Sul
Se oriente, rapaz
Pela constatação de que a aranha
Vive do que tece
Vê se não se esquece
Pela simples razão de que tudo merece
Consideração


Considere, rapaz
A possibilidade de ir pro Japão
Num cargueiro do Lloyd lavando o porão
Pela curiosidade de ver
Onde o sol se esconde
Vê se compreende
Pela simples razão de que tudo depende
De determinação


Determine, rapaz
Onde vai ser seu curso de pós-graduação
Se oriente, rapaz
Pela rotação da Terra em torno do Sol
Sorridente, rapaz
Pela continuidade do sonho de Adão



Obtido de: letras.terra.com.br/gilberto-gil/376449/


Gilberto Gil, um musico e compositor que muito admiro. Nesta letra de métrica tão sutil e sofisticada, ele nos fala de Oriente e oriente, num jogo de sentidos e metáforas. O marinheiro se orienta pelas constelações. Aqueles que levam cargas pro e do oriente, desde as primitivas rotas da seda, orientam-se. O cargueiro que leva mil coisas em seu porão, leva também o rapaz que busca a continuidade do sonho de Adão...proliferação. E quais povos seguem com vigor esse sonho? Os que estão no Oriente, certamente.
A letra de Gil fala do "cargueiro do Loyd", a empresa de navegação estatal que deixou sua marca no Sec. XX. Vários autores romanceiam histórias nos navios do Loyd. Tive a oportunidade de visitar um, no porto de Ilhéus. Era o Loyd Pacífico lá pelos anos 80, mas que já tinha a cabine de comando toda informatizada, uma jóia, que foi sucateado em razão dos problemas de gestão enfrentados pelas empresa. Falta de consideração...
Por
F@bio

sábado, 2 de julho de 2011

Antielegia às crianças velhas - Carlos Nejar

De: Carlos Nejar




"Todos podem ver o amor
e o amor não vê no cais
crianças carregando fardos,
entre adultos, carregando
a fonética dor de ir cedo
ou sem murmúrio,
envelhecendo.

E no orfanato o sonho
é bem menos exato
do que a dor.
Que piedade tem
a pobreza, que
misericórdia
no trabalho?
E andarão,
meninos, com
cargueiros
vergando o peito
cândido. Atrás
de uma rua,
uma casa
na infância.

Cada passo
é um túnel.
Cada passo,
um navio
que transporta
pedras e açucenas.
Cada passo, porta
que fermenta
surdos ossos, fuzis.

Cada porta, é a criança
chorando atrás da porta.
Cada lágrima
é a noite que rebenta."


Obtido de: http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/fale/article/viewFile/2421/1895


Carlos Nejar (Luiz C. Verzoni N.), advogado, professor e poeta, nasceu em Porto Alegre, RS, em 11 de janeiro de 1939. Além dos títulos de romancista, contista, dramaturgo, filósofo e historiador da literatura, Nejar é também chamado de "o poeta do pampa brasileiro".
Nos versos acima, Nejar nos brinda com esses versos cheios de lirismo e dor. Um retrato poético desse nosso país cheio de desigualdades, que ninguém vê, ou não quer ver. Cegos e surdos no amor. Não há sonho, não há misericódia, só meninos invisíveis carregando seu pesado fardo de dor, vergados pela carga do descaso.  
By
F@bio